A reportagem do China Daily desta quarta-feira 14, um dia após o jantar entre os presidentes Lula e Xi Jinping, com a presença das primeiras-damas Rosângela Lula da Silva e Peng Liyuan, sobre a explosão de vídeos com crianças nas redes sociais chinesas — muitos deles com claros sinais de exploração — lança luz sobre um problema global e urgente: os abusos cometidos nas plataformas digitais em nome do lucro, da audiência e da influência. Ao expor como influenciadores mirins estão sendo utilizados para gerar milhões de curtidas e ganhos financeiros, o jornal chinês, controlado pelo estado, reforça a necessidade de um debate sério sobre os limites éticos da internet.
É neste contexto que se insere a crítica firme e corajosa feita pelo presidente Lula e pela primeira-dama Rosângela Janja Lula da Silva ao TikTok — e que merece aplausos, apesar das intrigas plantadas na mídia brasileira durante a viagem presidencial à China. A primeira-dama apenas verbalizou uma preocupação legítima: muitos países estão entregando a formação psicológica, emocional e política dos jovens a algoritmos que premiam a banalidade, a erotização precoce e a desinformação.
Janja acertou. E não está sozinha. O próprio presidente Lula já alertou em fóruns internacionais — como o G20 e a ONU — para os riscos da desinformação em larga escala e da ausência de responsabilidade das grandes empresas de tecnologia. A proposta do Brasil por uma governança digital global, defendida em discursos recentes de Lula e também no jantar com o presidente Xi Jinping, vai justamente na direção de responsabilizar as plataformas por aquilo que promovem, monetizam e amplificam.
Do outro lado do mundo, o presidente da China, Xi Jinping, lidera uma agenda de regulação digital que, apesar de suas peculiaridades políticas, acerta ao colocar a proteção da infância no centro da discussão. O caso da pequena “Yaoyiyao Xiaoroubao”, menina de quatro anos usada como isca publicitária no Douyin, é simbólico: diante da repercussão negativa de vídeos que mostravam a criança caindo, sendo filmada e usada como vitrine comercial, o Estado interveio, forçando o afastamento da conta e promovendo restrições à publicidade voltada ao público infantil.
Mais de 11 mil contas foram banidas por explorarem a imagem de menores, exibindo desde simulações de violência doméstica a erotização infantil e exibições de riqueza para fins de manipulação emocional do público. O governo chinês também exigiu que aplicativos como Douyin, Huawei e Oppo implantassem modos de navegação infantil com limites de tempo, conteúdo e interações, além de fortalecer os filtros de segurança e mecanismos de denúncia. Por isso mesmo, o presidente Lula afirmou, durante sua coletiva de imprensa, que o presidente Xi afirmou que o Brasil também deve regular os abusos – sem que isso tenha gerado qualquer constrangimento, ao contrário do que foi plantado pela imprensa brasileira.
É exatamente disso que se trata: construir um ambiente digital mais seguro, ético e saudável. A falsa dicotomia entre liberdade e regulação precisa ser superada. O que Lula, Janja e Xi Jinping indicam, cada um a seu modo, é que a liberdade digital não pode ser confundida com a licença para agredir, explorar ou manipular — especialmente os mais vulneráveis, como crianças e adolescentes.
Janja está no caminho certo ao pautar o tema em alto nível. Sua preocupação não é moralista, mas política e social. O TikTok, com sua lógica de viralização baseada em recompensas rápidas e exposição extrema, vem moldando comportamentos e afetando negativamente a saúde mental de jovens no mundo todo. O alerta da primeira-dama deveria provocar um debate público sério, e não linchamentos virtuais movidos por ressentimento ideológico de uma imprensa velha e carcomida.
O Brasil, assim como a China e outras nações que colocam a dignidade humana acima da lógica do mercado absoluto, precisa avançar em marcos regulatórios que responsabilizem as plataformas – o que não significa fazer a regulação escrita pela mesma mídia que promove o linchamento de Lula e Janja. É hora de discutir com seriedade o impacto da era digital nas novas gerações e proteger quem ainda não tem voz própria para se defender.