Ao prestar depoimento, Heleno optou por responder apenas às perguntas feitas por seu advogado, Matheus Milanez, recusando-se a falar com o ministro Alexandre de Moraes, o procurador-geral da República Paulo Gonet e as demais defesas. Ele é o quinto acusado a ser ouvido na etapa atual do processo, após Mauro Cid, Alexandre Ramagem, Almir Garnier e Anderson Torres. Também serão ouvidos ainda Jair Bolsonaro (PL), Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto.
“Não havia oportunidades” - Milanez questionou diretamente se seria correto afirmar que Heleno "nunca defendeu qualquer atitude ilegal". O general respondeu: “não havia oportunidades. O próprio presidente, na declaração dele, cortou a possibilidade”. Quando instado a responder de forma mais clara, em formato de “sim ou não”, Heleno apenas reafirmou que não tomou atitudes ilegais.
Em outro trecho, o advogado perguntou se Heleno ajudou a “construir um discurso de desinformação” sobre as urnas eletrônicas a favor de Jair Bolsonaro. O general negou: “eu não tinha nem tempo para fazer isso”. A defesa, no entanto, precisou repetir perguntas e pedir que Heleno fosse mais direto, tamanha a imprecisão das respostas, que geravam margem para múltiplas interpretações. Milanez chegou a tentar encerrar a participação do ex-ministro antes do tempo.
Tentativa de infiltrar a Abin e versão ao STF - Uma das principais acusações da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Heleno envolve declarações em reunião ministerial de julho de 2022, quando ele indicou, segundo o Ministério Público, que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) poderia ser usada para infiltrar agentes nas campanhas eleitorais.
Na ocasião, o general afirmou: “eu já conversei ontem com o Victor, que é o novo diretor da Abin. Nós vamos montar um esquema para acompanhar o que os dois lados estão fazendo [...] Se houver qualquer acusação de infiltração desse elemento da Abin em qualquer lugar...”.
Já diante do STF, Heleno disse que o objetivo da conversa com o diretor interino da Abin, Victor, era garantir segurança nas eleições: “eu realmente conversei com o Victor, que era à época o diretor interino da Abin, para que fosse realizado um acompanhamento das eleições presidenciais para evitar que acontecesse algo como ocorreu com Bolsonaro na facada de Juiz de Fora”.
Acusações de golpismo - De acordo com a PGR, Heleno foi responsável pelo "direcionamento estratégico" da organização criminosa envolvida na trama golpista. O general é apontado como conselheiro direto de Bolsonaro e, segundo o Ministério Público, teria continuado a operar no coração da inteligência do governo mesmo após as eleições.
Apesar disso, as testemunhas de defesa tentaram mostrar que ele se afastou de Bolsonaro no fim do mandato. Relataram ainda que Heleno teria coordenado normalmente a transição para o novo governo, mantendo pessoal técnico e sem politizar o órgão.
Gabinete de crise e papéis manuscritos - Outro elemento que reforça as suspeitas é um documento redigido pelo general da reserva Mario Fernandes — um dos principais investigados — prevendo a criação de um “Gabinete Institucional de Gestão de Crise”, que seria comandado por militares logo após o golpe de Estado. A minuta colocava Heleno como chefe do grupo, formado por 18 integrantes, a maioria da reserva do Exército.
Papéis manuscritos do próprio Heleno apreendidos pela Polícia Federal também indicam que o governo Bolsonaro considerou usar a Advocacia-Geral da União (AGU) para “impedir operações policiais consideradas pela própria administração como ilegais”.
Segundo os investigadores, tais documentos descrevem uma “comunhão de esforços” para dar poderes à AGU com o intuito de validar decisões judiciais que favorecessem o grupo. Para a PF, os elementos reunidos "não deixam dúvidas de que a organização criminosa estava elaborando estudos para tentar coagir integrantes do sistema de persecução penal para que as investigações fossem cessadas".
Abin sob comando do GSI - A Polícia Federal aponta ainda que a Abin foi aparelhada durante o governo Bolsonaro para realizar espionagem contra opositores, plantar desinformação sobre o processo eleitoral e tentar influenciar o resultado das urnas. O órgão é subordinado diretamente ao GSI, que estava sob comando de Heleno.